Em busca do sentido

Afinal, Qual é o sentido da vida?

data-filename="retriever" style="width: 100%;">Foto: Reprodução

A vida, muitas vezes, nos coloca em posições que provocam questionamentos. Dúvidas, angústias e medo são sentimentos que nos cercam nas mais variadas circunstâncias. Nessas horas, perguntamos: "por que isso está acontecendo comigo"? "afinal, qual é o sentido da vida"?

Após sobreviver a quatro campos de concentração, o neuropisquiatra austríaco Viktor Frankl publicou o livro "Em busca do sentido", no qual relata as mais cruciais experiências que um ser humano poderia vivenciar em uma guerra. Entre fome, dor, torturas físicas e emocionais, suicídio de amigos, entre outras atrocidades, ele passou a perguntar a si mesmo se a própria existência ainda valeria de alguma coisa. E foi a respeito deste livro que a jornalista Fabiana Sparremberger e o psicólogo Diógenes Chaves conversaram no Faz Sentido do último domingo, 17 de abril.

A OBRA
Para Fabiana, a experiência com o livro foi desafiadora. Como mãe, filha, amiga e principalmente como ser humano é quase impossível não ter que interromper a leitura para meditar e até mesmo chorar em alguns pontos.

- A gente se emociona mesmo. Viktor conseguiu descrever em detalhes a realidade de um campo de concentração e tudo o que está relacionado a tal cenário. Ele conseguiu observar a si mesmo e aos outros diante do extermínio nazista de Auschwitz e fez disso uma oportunidade de buscar o sentido da vida - comenta a jornalista.

De acordo com Diógenes, essa é uma leitura essencial no momento atual, pós pandemia:

- A gente lida com diversos sentimentos, como angústias e aflições. O livro nos ensina a buscar sentido no sofrimento. Muitas vezes, achamos que devemos repelir essa sensação, e não é o certo. A obra traz uma mensagem especial, apesar da experiência de fome, dor e de presenciar os amigos serem assassinados ou cometerem suicídio.

O autor propõe, segundo Fabiana, que os momentos de dor e sofrimento servem para as mais importantes reflexões que nos levam a aprender muito:

- Viktor descreve as reações dele e dos prisioneiros em três fases distintas: a chegada no campo de concentração, a vivência durante e, por fim, a libertação. Ele destaca a essência do que é ser humano e enfatiza a capacidade de superar uma situação desumanizadora, como a que ele e milhares de pessoas passaram e, mesmo assim, encontrarem o sentido da vida. Vários trechos chamaram a minha atenção, entre eles, quando ele relata a tendência de se perder a sensibilidade das emoções em meio ao terror.

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Segundo o psicólogo, isso acontece porque temos em nossa mente uma defesa psíquica: 

- Viktor passou por diversos momentos em que teve a força testada. Naquele cenário, precisou usar mecanismos para não se desesperar, desanimar ou até mesmo tentar suicídio. Um dos artifícios que ele usou para tirar o foco de toda aquela desgraça foi o humor, por incrível que pareça. O autor nos lembra que, quando estamos passando por um momento de sofrimento, queremos repulsá-lo e não vivê-lo. No entanto, a fuga nunca resolve, só perpetua a dor - argumenta.

A NOSSA PARTE
E a nossa responsabilidade com isso tudo? Com a dor, com o medo, com o lado difícil da vida, como uma perda, luto, um diagnóstico terrível? Por que não questionarmos, também, o que podemos fazer por nós e pelos outros quando tudo está errado?

- Temos que parar e perguntar o que a vida quer de nós. Se o bem-estar tem sentido na nossa vida, porque o sofrimento não teria? O livro nos desafia a aprendermos a lidar com os momentos desagradáveis também - diz Diógenes.

Fabiana lembra que momentos difíceis são oportunidades, principalmente de evolução.

- Apesar de estar diante de todas as dificuldades, ele procurava focar a atenção em coisas simples do dia a dia e as admirava. Por exemplo, quando ele fala que em uma viagem para outro campo de concentração, onde todos estavam apertados dentro do ônibus, ele ficou na ponta do pé para ver uma árvore e o sol. Isso provoca na gente um repensar muito significativo - reflete.

APRENDIZADO
"Precisamos aprender e ensinar as pessoas em desespero que, a rigor, nunca e jamais, importa o que nós ainda temos a esperar da vida, mas, exclusivamente o que a vida espera de nós. Não perguntamos mais pelo sentido da vida, mas questionamos a nós mesmos, como aqueles, aos quais a vida dirige perguntas diariamente e a cada hora. Perguntas que precisamos responder, dando a resposta adequada, não através de elucubrações ou discursos, mas apenas através da ação, através da conduta correta". Neste trecho, Viktor desafia o leitor a aprender e a ensinar ao mesmo tempo. Para Diógenes, o autor nos leva a entender que não somos meros espectadores de nossas vidas, que não podemos deixar que os momentos apenas passem diante de nossos olhos: 

- A gente costuma olhar para os problemas e esperar que se resolvam sozinhos. Não queremos encará-los. Queremos as repostas prontas, mas devemos buscá-las por nós mesmos.

DESAFIOS
Afinal, temos problemas ou desafios? O psicólogo explica que não é saudável ver tudo como problema, sendo que, na verdade, desafios existem para serem enfrentados.

- Se a vida está me propondo um desafio, o que ela quer de mim? Ela quer que eu desenvolva minhas virtudes e potencialidades? Encarar os problemas como desafios é se responsabilizar por eles. Caso contrário, começo a me culpar e punir por não conseguir resolver - argumenta o psicólogo.

LOGOTERAPIA
Um dos métodos fundados por Viktor Frankl é a logoterapia, sistema que explora o sentido existencial do individuo e a dimensão espiritual. Diógenes explica que o método é conhecido como a terceira escola da psicoterapia. A primeira é a Psicanálise de Sigmund Freud, e a segunda é a Psicologia Individual de Alfred Adler:

- Nesta terceira escola, Viktor ensina que somos movidos pela busca pelo sentido da vida. Essa abordagem vem de encontro com as experiências que ele viveu e presenciou no campo de concentração. Lá era impossível buscar prazer e poder. O que restava a ele era buscar sentido naquela situação. Portanto, a Logoterapia nos beneficia com as reflexões de buscarmos sentido para o que nos acontece. Fazemos a clássica pergunta: o que a vida quer de ti nesse momento? 

Ainda conforme o psicólogo, Viktor desenvolveu diversas técnicas a partir dessa abordagem: 

- A logoterapia te mostra que o melhor caminho é enfrentar as situações, seja quais forem.

Para Fabiana, o livro realmente deixa várias reflexões, além de ser um chamado à ousadia e ao encorajamento, mesmo que seja em confrontos pesados:

- Achei muito impactante, no começo do livro, quando Viktor relata que ouvia atentamente todo o discurso de sofrimento da pessoa e perguntava "por que você não tenta o suicídio?" Com essa pergunta, ele fazia a pessoa enxergar as razões para continuar a viver e resolver a situação. São nessas horas que lembramos de tudo o que amamos - reflete ela.

PILARES
Conforme Diógenes, o primeiro pilar da logoterapia é o sentido da vida, que tem o objetivo de mostrar que a vida tem um sentido, ela não é um vazio. 

- O segundo pilar é a vontade de sentido. Temos o anseio de encontrar uma razão para viver. Essa pergunta (por que você não tenta o suicídio?) que Viktor faz é um artifício de provocar as pessoas a irem atrás de um rumo. O terceiro pilar diz respeito à liberdade de vontade. Somos livres para guiar nossas vidas, para buscar conforto e bem-estar. Diante de toda aquela situação de horror, vivenciada por Viktor, ele poderia se convencer que realmente estava privado de liberdade e se entregar a todos os sentimentos de sofrimento, mas ele escolheu se movimentar. Por ser livre foi buscar ferramentas para se fortalecer. 

NA PRÁTICA
Fabiana ressalta a importância de colocar em prática o aprendizado de um tema tão profundo como a busca pelo sentido da vida:

- Como usar essas convocações que a vida nos faz? Como buscar o sentido da vida? Como se ensina tudo isso - questiona.

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Para Diógenes, Viktor coloca essas possibilidades em três valores básicos: 

- No valor da criação, entendemos que nascemos com potencial e anseio pelo bem-estar. No valor de experiência, olhamos para o que adquirimos ao longo das diferentes fases da vida, sejam sucessos e fracassos. O último valor é a atitude, ou seja, refere-se à postura que temos diante do sofrimento, é a escolha de como vamos sofrer. Como disse Viktor, "sofrer com dignidade é o bem sofrer, não é se vitimizar". Diante disso, todos temos a liberdade de escolher como iremos olhar e vivenciar o sofrimento - conclui o profissional.

O Faz Sentido contou, ainda, com a participação de mais três profissionais que deixaram suas reflexões a respeito do livro e da logoterapia. Confira:

Patrick Camargo, psicólogo - "Nessa obra, Viktor Frankl nos leva a refletir a respeito do que realmente faz sentido ou o que é a vida, e como podemos enfrentá- la de uma maneira que possamos suportar as dificuldades. É mais fácil dizer que não suportamos por medo de encarar, do que pensar que é apenas mais um ciclo. Infelizmente, avaliamos apenas experiências positivas, mas as negativas também fazem parte da humanidade." 

Carlos Eduardo Seixas, psicólogo - "Sabemos que o sofrimento é o oposto do bem-estar. Porém, é importante ter em mente que o sofrimento pode significar autoconhecimento. O primeiro passo é analisar se ele é uma característica emocional, física ou até psicossomática. Um dos passos mais importantes é não se vitimizar. O grande desafio é processar o momento. Vivenciar os nossos sentimentos é fundamental, sejam eles confortáveis ou não. Sem sentimento e sem emoção, a vida não faz sentido." 

Lilian Pereira, psicóloga - "A Terapia Cognitiva Comportamental (TCC) dialoga muito bem com a logoterapia. Por ser uma teoria aberta, ela combina com outras abordagens. Na medida em que a logoterapia busca o sentido para a vida, é possível fazer questionamentos para ampliar o repertorio cognitivo. Ela provoca o sentido para viver, apesar de circunstâncias desfavoráveis. Temos que considerar as potencialidades de cada caso, não centrar apenas nos aspectos psicopatológicos. Isso é compatível com a psicoterapia com adultos e idosos, na psicologia de saúde hospitalar, na neuropsicologia, tanto em avaliação quanto na reabilitação neuropsicológica."

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